quarta-feira, 29 de julho de 2009

O determinismo geográfico

O determinismo geográfico considera que as diferenças do ambiente físico condicionam a diversidade cultural. São explicações existentes desde a Antiguidade, do tipo das formuladas por Pollio, Ibn Khaldun, Bodin e outros, como vimos anteriomente.
Estas teorias, que foram desenvolvidas principalmente por geógrafos no final do século XIX e no inicio do século XX, ganharam uma grande popularidade. Exemplo significativo desse tipo de pensamento pode ser encontrado em Huntington, em seu livro Civization and Climate (915), no qual formula uma relação entre a latitude e os centro de civilização, considerando o clima como um fator importante na dinâmica do progresso.
A partir de 1980, antropólogos como Boas, Wissler, Kroeber, entre outro, refutaram este tipo de determinismo e demonstraram que existe uma limitação na influência geográfica sobre os fatores culturais. E mais: que é possível e comum existir uma grande diversidade cultural localizada em um mesmo tipo de ambiente físico.
Tomemos, como primeiro exemplo, os lapões e os esquimós. Ambos habitam a calota polar norte, os primeiros no norte da Europa e o segundos no norte da América. Vivem, pois, em ambientes geográficos muito semelhantes, caracterizados por um longo e rigoroso inverso. Ambos têm ao seus dispor flora e fauna semelhantes. Era de se esperar portanto, que encontrassem as mesma respostas culturais para a sobrevivência em um ambiente hostil. Mas isso não ocorre:
Os esquimós constroem suas casas (iglus) cortando blocos de neve e amontoando-os num formato de colméia. Por dentro a casa é forrada com peles de animais e com o auxilio do fogo conseguem manter o seu interior suficientemente quente. É possível, então, desvencilhar-se das pesadas roupas, enquanto no exterior das casa a temperatura situa-se a muitos graus abaixo de zero grau centígrado. Quando deseja, o esquimó abandona a casa tendo que carregar apenas os seus pertences e cai construir um novo retiro.
Os lapões, por sua vez, vivem em tendas de peles de rena. Quando desejam mudar os seus acampamentos, necessitam realizar um árduo trabalho que se inicia pelo desmonte, pela retirada do gelo que se acumulou sobre as peles, pela secagem das mesmas e o seu transporte para o novo sitio.
Em compensação, os lapões são excelentes criadores de renas, enquanto tradicionalmente os esquimós limitam-se à caça desses mamíferos.
A aparente pobreza glacial não impede que os esquimós tenham uma desenvolvida arte de esculturas em pesa-sabão e nem resolvam os seus conflitos com uma sofisticada competição de canções entre os competidores.
Um segundo exemplo, trancrito de Felix Keesing, é a variação cultural observada entre os índios do sudeste norte-americados:
Os índios Pueblo e Navajo, do sudeste americano, ocupam essencialmente o mesmo hábitat, sendo que alguns índios Pueblo até vivem hoje em “bolsões” dentro da reserva Navajo. Os grupos Pueblo são aldeões, com uma economia agrícola baseada principalmente de viveres, que se alimentavam de castanhas selvagens, sementes de capins e de caça, mais ou menos como os Apache e outros grupos vizinhos têm feito até os tempos modernos. Mas, obtendo ovinos dos europeus, os Navajo são hoje mais pastoneadores, vivendo espalhados com seus rebanhos em grupos de famílias. O espírito criador do homem pode assim envolver três alternativas culturais bem diferentes – apanha de viveres, cultivo, pastoreio – no mesmo ambiente natural, de sorte que não foram fatores de hábitat que proporcionaram a determinante principal. Posteriormente, no mesmo habitat, colonizadores americanos tiveram que criar outros sistemas de vida baseados na pecuária, na agricultura irrigada e na urbanização.
O terceiro exemplo pode ser encontrado no interior de nosso país, dentro dos limites do Parque Nacional do Xingu. Os xinguanos propriamente dito (Kamayurá, Kalapalo, Trumai, Waurá etc.) desprezam toda a reserva de proteínas existentes nos grandes mamíferos, cuja caça lhes é indeterminada por motivos culturais, e se dedicam mais intensamente à pesca e caça de aves. Os Kayabi, que habitam o Norte do Parque, são excelentes caçadores e preferem justamente os mamíferos de grande porte, com a anta, o veado, o caititu etc.
Estes três exemplos mostram que não é possível admitir a idéia de determinismo geográfico, ou seja, a admissão da “ação mecânica das forças naturais sobre uma humanidade puramente receptiva”. A posição da moderna antropologia é que a “cultura age seletivamente”, e não casualmente, sobre seu meio ambiente, “explorando determinadas possibilidades e limites ao desenvolvimento, para o qual as forças decisivas estão na própria cultura e na historia da cultura”.
As diferenças existentes entre os homem, portanto, não podem ser explicadas em termos das limitações que lhes são impostas pelo seu aparato biológico ou pelo seu meio ambiente. A grande qualidade de espécie humana foi a de romper com suas próprias limitações; um animal frágil, provido de insignificante força física, dominou toda a natureza e se transformou no mais temível dos predadores. Sem asas, dominou os ares; sem guelras ou membranas próprias, conquistou os mares. Tudo isto porque difere dos outros animais por ser o único que possui cultura.

Por: Leidiane Santos

Um comentário:

  1. A partir de 1980, antropólogos como Boas, Wissler, Kroeber,(aff) por favor, reveja seus apontamentos... a data não procede!!

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